No. 20 (10): Arte, Docência e Identidades

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Editorial

Escrevo este Editorial em homenagem ao Prof. Dr. Marco Antonio Gomes de Araújo, professor da FUNDARTE de 2003 a 2010, que atuou no convênio com a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS, no curso de Graduação em Artes Visuais – Licenciatura, e que nos deixou no final de 2010. Marco foi em busca do seu objetivo profissional na Universidade de Brasília – UnB, onde recém assumira como docente, quando teve sua vida interrompida por um desses acasos perversos e incompreensíveis: foi atropelado em uma rua do campus universitário e não resistiu aos ferimentos. Para nós da FUNDARTE, seus colegas e ex-alunos, fica a lembrança do artista criativo e inquieto, do professor crítico, engajado e sempre presente em todos os momentos em que foi  necessário unir forças para dialogar, reivindicar e gritar pela permanência e qualificação dos cursos do convênio UERGS/FUNDARTE. Fica também o registro de sua inestimável contribuição à Galeria de Arte Loide Schwambach, ao Grupo de Pesquisa em Arte: criação, interdisciplinaridade e educação do qual foi coordenador e, principalmente, a sua contribuição a esta Revista, durante o período em que foi Editor (anima e cuore), de 2007 até sua saída em agosto de 2010. Sua coordenação iniciou com a Revista nº 11 e 12, jan/dez de 2006 até a 19ª de jan/jun de 2010. Suas marcas farão parte da memória da nossa instituição e serão lembradas sempre que nos referirmos aos Cursos de Graduação em Artes Visuais, em Dança, em Música e em Teatro, do convênio UERGS/FUNDARTE, ou às diversas outras atividades que aqui realizou. O Prof. Marco permanecerá, especialmente, como exemplo de profissional comprometido com seu tempo e contexto.

Nesta 20ª edição da Revista da FUNDARTE apresentamos nove artigos cujas temáticas abarcam discussões nas áreas de artes visuais, dança, música, teatro e cultura. A partir de diferentes pontos de vista são abordados aspectos referentes ao fazer artístico e a docência, frutos tanto de estudos individuais, quanto pesquisas coletivas no campo das artes que oferecem um panorama do que move e preocupa educadores de todos os níveis de ensino.

O primeiro texto “Repetição, utopia e fracasso” de Andrea Hofstaetter, problematiza a questão da repetição em arte e sugere pensá-la por um outro viés, que produza rupturas nesse processo e possa gerar a transgressão, a produção do novo, a quebra dos mecanismos de perpetuação, não só na arte, mas também na vida cotidiana. “Técnicas para uma (des)construção pós-dramática do texto”, de Paola Zordan e Patrícia Unyl é um ensaio, recorte de um estudo mais amplo, que se refere ao pós-dramático e outras manifestações das artes cênicas contemporâneas.

As autoras trazem à cena Nietzsche, Deleuze, Guatarri e Derrida entre outros, para discutir conceitos da práxis teatral e abordar o processo de criação, o trágico, a concepção de planos e de corte, a desconstrução, os sentidos e o não sentidos do corpo e do texto.

No artigo “Corpo-criança: um diálogo entre teatro e saúde mental na infância”, Fabíola Rahde Fernandes, Carlos Roberto Modinger e Cássio Lamas Pires nos apresentam a experiência realizada na Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul, com crianças em situação de vulnerabilidade psíquica e social. São abordados os conceitos de jogo, teatro e saúde mental, apoiados em  Huizinga, Ferracini, Merhy, Ziegelmann e Courtney, entre outros teóricos.

A trama de três elementos presentes no campo da Arte e suas relações é o tema de Carlos Faustino que desde Portugal nos brinda com o artigo “Para um médium do real do espelho, do vídeo, do virtual”. Faustino, a quem damos as boas vindas a nossa Revista, arrisca uma hipótese de conjugação entre o real (representado pelo espelho), o digital (representado pelo vídeo) e o virtual, e conta com teóricos como Kraus, Einsner, Costa, Sacks e Mateus para avançar em sua investigação.

“A sistematização da dança nos preceitos artísticos de Platão” de Rousejeanny da Silva Ferreira, toma como ponto de partida as concepções de dança na antiguidade clássica e as idéias de Platão para abordar como se deu a construção da dança acadêmica ocidental. A autora refere-se a vários teóricos para compor seus texto e elucidar aspectos da influência dos ideais gregos no modo como entendemos o corpo e suas manifestações.

Centrado em um projeto social de uma oficina de vídeodança, realizado com crianças em situação de vulnerabilidade, na cidade de Porto Alegre/RS, o artigo “Estéticas infantis: como operar com as crianças a mescla de dança e video?” de Susana França da Costa, relaciona os “blocos de sensações” descritos por Deleuze à ideia de processo criativo em arte. Investigar como operar com as crianças a mescla de vídeo e dança, relacionada “a um mecanismo de resistência” é o foco do estudo que se apóia teoricamente em Deleuze, Guattari e Fernandes.

Daniel Granada da Silva Ferreira, no artigo “Fazer o bem, faz bem: notas sobre identidade e o aprendizado da capoeira na França”, aborda os temas identidade e etnicidade, discorrendo em seu artigo sobre a prática da capoeira realizada em Ivry sur Seine, no subúrbio de Paris. A pesquisa realizada por meio do método de observação participante e de entrevistas formais e informais, com praticantes de capoeira, mostra que as ideias de “fazer o bem” e de que a capoeira “faz bem” perpassa o “processo de construção da identidade dos praticantes”.

O artigo “A formação do educador musical no mundo hodierno: pensamentos necessários perspectivados na realidade brasileira” traz as preocupações do autor Jonas Tarcísio Reis com relação à educação em sentido geral e, em sentido mais restrito, enfoca a formação do educador musical que atua no campo da educação básica. Contribui para sua reflexão os estudos de Le Boterf e Perrenoud que discutem a respeito da formação profissional além de Bellochio, Penna e Souza entre outros.

Por fim, em seu texto “A ética da docência em Teatro” Márcia Pessoa Dal Bello traz contribuições importantes para pensar a formação do professor e sua prática docente e o quanto estas questões transbordam para seus alunos e os afetam. Os estudos de Foucault sobre ética e de Stanislawski sobre a pedagogia do teatro dão suporte às reflexões da autora.

Ao assumir a coordenação da revista, desejo a todos e a todas que tenham uma boa leitura e que os artigos aqui oferecidos, possam provocar o desassossego necessário à busca de novas reflexões. Agradeço imensamente aos que enviaram seus textos, aos pareceristas desta edição e suas análises criteriosas, e à colaboração generosa de muitos que contribuem para a manutenção da revista. Espero que possamos continuar avançando na qualificação da Revista da FUNDARTE.

Maria Isabel Petry Kehrwald
Coordenadora da Revista

Published: 01/12/2010